Viver com uma lesão medular representa um desafio que ultrapassa a dimensão física. Para quem enfrenta uma situação de paraplegia ou tetraplegia, cada pequeno movimento recuperado é um passo em direção à autonomia funcional, à independência e à reconstrução da qualidade de vida.
Na reabilitação neurológica, a fisioterapia assume um papel central. Mais do que um conjunto de técnicas, a fisioterapia para lesão medular constitui-se como uma ponte entre as limitações impostas pela lesão e o potencial de recuperação funcional que ainda pode ser alcançado.
A complexidade da lesão medular
As lesões medulares têm um impacto profundo na mobilidade, na função e na participação social. Dependendo da localização e da gravidade, estas lesões podem comprometer funções básicas como a marcha, a respiração, o controlo postural ou até a coordenação motora fina.
Mais do que compreender a anatomia e a fisiopatologia, o fisioterapeuta precisa de interpretar o que cada lesão significa na vida daquela pessoa e ajustar a estratégia de intervenção ao seu contexto único.
Avaliação personalizada: o ponto de partida
Na reabilitação neurológica, uma avaliação inicial detalhada é essencial para identificar capacidades preservadas, limitações, fatores de risco e o próprio potencial de recuperação.
Nesta fase são então analisados elementos como:
• Histórico clínico
• Exames neurológicos e musculoesqueléticos (força, tónus, sensibilidade, dor, amplitude articular, etc.)
• Respiração e tosse efetiva (fatores essenciais em níveis cervicais e altos torácicos)
• Equilíbrio e controlo do corpo
• Risco de complicações (úlceras, trombose, espasticidade, dor neuropática, etc.)
• Medidas de resultado e funcionalidade, para monitorizar o progresso de forma objetiva.
É este processo que orienta o desenho de um plano terapêutico individualizado, com objetivos realistas e mensuráveis, alinhados com aquilo que é mais importante para o paciente: recuperar a mobilidade, reforçar a autonomia, retomar a sua vida aos poucos (voltar a estudar ou a trabalhar, voltar a conduzir, praticar desporto adaptado).
Estratégias de intervenção da fisioterapia na lesão medular
A intervenção fisioterapêutica inclui uma variedade de abordagens que vão desde o fortalecimento muscular e treino funcional até estratégias de transferência segura e de otimização da mobilidade em cadeira de rodas.
Com os avanços da reabilitação, surgem recursos que permitem:
• Melhorar a função motora residual;
• Reforçar a estabilidade do tronco e o controlo postural;
• Potenciar o uso de tecnologias assistivas;
• Promover atividades significativas no dia a dia.
O papel do fisioterapeuta na intervenção em lesões medulares
O papel do fisioterapeuta não se esgota no exercício clínico. Envolve também educar a pessoa e a família para a criação de novas rotinas, orientar sobre adaptações no quotidiano, incentivar a prática de atividades seguras e criar condições para que cada conquista seja um passo concreto em direção à independência.
Também temas como autocuidado, desporto e lazer adaptados, sexualidade e intimidade numa perspetiva funcional e respeitosa, e apoio emocional, são trabalhados entre o fisioterapeuta e outros profissionais, que compõem a equipa multidisciplinar atribuída ao utente.
Mais do que reabilitar o corpo, trata-se de reconstruir possibilidades e devolver ao paciente a confiança para retomar a sua vida. E a reabilitação ganha ainda mais força quando assente num modelo multidisciplinar: fisioterapia, terapia ocupacional, enfermagem, medicina de reabilitação, psicologia, nutrição, serviço social. Em conjunto, todos contribuem para consolidar ganhos e prevenir regressões.
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Webinário “Além da Lesão Medular”
Nesta sessão, são discutidos os principais desafios da prática clínica com pessoas com lesão medular, a importância da avaliação personalizada e as estratégias mais atuais para promover funcionalidade, mobilidade e qualidade de vida.
Na recuperação de lesões medulares, cada plano terapêutico, cada exercício adaptado e cada estratégia de reabilitação representam passos concretos para ultrapassar barreiras, recuperar confiança e reencontrar independência no quotidiano. Mas para isso, é necessário que os profissionais de saúde, neste caso, os fisioterapeutas, reúnam competências e conhecimentos relevantes, atualizados e comprovados para, em conjunto com os pacientes, conseguirem atingir as metas de recuperação definidas.