Nunca estivemos tão expostos, nem tão atentos, à imagem que projetamos. Entre filtros, stories e reels, as redes sociais redefiniram o que significa “sentir-se bem na própria pele”. Mas este novo território digital, onde likes e comentários parecem medir valor pessoal, tem um custo: o aumento da insatisfação corporal e da fragilidade da autoestima, sobretudo entre adolescentes e jovens adultos.
A pressão nas redes sociais é real? Os dados confirmam que sim!
De acordo com um estudo realizado pela Dove em oito países, incluindo Portugal, intitulado “
Dove Self-Esteem and Social Media Report”, mostra-nos os dados alarmantes dos impactos negativos das redes sociais na autoestima e autoimagem corporal, especialmente nos mais jovens.
Este estudo contemplou cerca de 1.200 portugueses, sendo que destes, 700 eram jovens com idades compreendidas entres os 10 e os 17 anos, e os restantes eram pais.
O que nos indica este estudo? Primeiramente, 7 em 10 jovens mulheres sentem pressão para estarem sempre apresentáveis e arranjadas. Mais de metade sentem mesmo pressão para serem bonitas.
Além disso, indica ainda que, embora ¼ das jovens sinta e afirme que não consegue acompanhar os padrões de beleza atuais, mais de 75% das raparigas, aos 13 anos, já utilizaram aplicações para manipular digitalmente a sua imagem e 64% tentam modificar ou esconder uma parte do corpo antes de publicarem uma fotografia sua nas redes sociais.
A “febre” das selfies: serão assim tão espontâneas?
As selfies, populares entre as gerações mais novas, não são, de todo, fotografias orgânicas e espontâneas. De acordo com este mesmo estudo, em média, as raparigas tiram 9 selfies antes de escolherem uma em que se sintam bonitas o suficiente para publicar.
Mas o processo de preparação para tirar uma simples selfie é ainda mais complexo: 45% das jovens demoram mais de 10 minutos a arranjar-se para uma selfie, o que inclui arranjar o cabelo, maquilharem-se e escolherem o melhor “outfit”.
Depois de escolherem a fotografia para publicar, procuram a validação de uma amiga e recorrem então à manipulação digital, onde modificam feições do rosto, o cabelo, branqueiam os dentes, aumentam os lábios, aperfeiçoam a pele, o nariz ou a barriga.
Podemos constatar que esta presença digital constante nos expõe, sem trégua, a padrões corporais idealizados e a conteúdos manipulados que moldam as expectativas - muitas vezes irreais - em relação ao corpo e ao valor pessoal.
A comparação social online, mediada por algoritmos que reforçam determinados estereótipos visuais, tem sido associada ao aumento de sintomas de ansiedade, depressão e insatisfação corporal. Estes mecanismos, silenciosos e cumulativos, podem atuar como gatilhos ou fatores de manutenção em quadros clínicos complexos, incluindo perturbações do comportamento alimentar e distúrbios de imagem corporal.
Mecanismos Psicológicos: Como as Redes Sociais Afetam a Autoestima?
A influência das redes sociais na autoestima está intimamente relacionada com vários processos psicológicos bem documentados:
• Comparação social ascendente: ao expor-se repetidamente a imagens idealizadas, o utilizador tende a comparar-se com perfis que aparentam ter mais beleza, sucesso ou validação, o que pode diminuir o valor pessoal percebido.
• Feedback social (likes, comentários, partilhas): os reforços digitais funcionam como validadores externos de autoimagem. Quando inexistentes ou negativos, geram frustração, sentimentos de rejeição e questionamento da própria identidade.
• Internalização de ideais de aparência: a repetição de determinados corpos, rostos e estéticas leva à adoção inconsciente de padrões normativos e inatingíveis, com impacto direto na construção da imagem corporal.
• Vigilância corporal constante: o ato de publicar conteúdo, tirar selfies e rever a própria imagem fomenta uma monitorização crónica do corpo, associada à objetificação e à diminuição do bem-estar psicológico.
Estes processos, em especial quando conjugados com vulnerabilidades prévias (como baixa autoestima basal ou historial de crítica corporal), contribuem para a intensificação de psicopatologias existentes ou para o aparecimento de novas perturbações.
Implicações Clínicas e Estratégias de Intervenção
A atuação clínica perante estes fenómenos exige uma abordagem multifacetada. Para além da escuta empática e da reformulação cognitiva, é essencial integrar temas como a educação crítica sobre redes sociais e a promoção da literacia emocional digital. Entre as estratégias possíveis, destacam-se:
• Psicoeducação sobre funcionamento das redes e construção de imagem online;
• Intervenções baseadas em Mindfulness, que ajudam a reduzir a vigilância corporal e o impacto emocional da comparação social;
• Terapias focadas na autoestima, com enfoque na valorização de qualidades internas e desconstrução de padrões de beleza;
• Exposição controlada a conteúdos body-positive, com análise crítica em contexto terapêutico;
• Promoção de períodos de “detox digital” ou gestão do tempo online com metas realistas e práticas.
Além disso, programas preventivos em contexto escolar e familiar são essenciais, assim como a inclusão de pais e educadores no processo de consciencialização dos riscos e das boas práticas digitais.
Literacia Mediática como Fator de Proteção
A literacia mediática é hoje reconhecida como uma competência transversal de promoção da saúde mental. Envolve não apenas saber utilizar plataformas, mas compreender o seu impacto psicológico e social. A capacidade de interpretar criticamente o que se vê, identificar filtros, e reconhecer distorções da realidade é uma ferramenta terapêutica valiosa.
A formação de psicólogos e educadores para integrarem estes conteúdos em consultas, sessões de grupo ou ações de sensibilização torna-se, por isso, uma prioridade.
Formação: A chave para mitigar estes impactos
Compreender o impacto das redes sociais na autoestima é essencial para uma intervenção clínica eficaz. Cabe aos profissionais promover uma utilização mais consciente, crítica e saudável destes espaços digitais. E a formação é essencial para que isso seja possível.
Especialização em Psicopatologia da Criança e do Adolescente
Esta formação oferece um enquadramento sólido sobre o neurodesenvolvimento e perturbações associadas; ferramentas práticas de avaliação e intervenção em contextos clínicos; e análise de casos reais para aplicação dos conhecimentos em prática supervisionada. Ideal para psicólogos, profissionais de saúde e educação que queiram especializar-se na compreensão e intervenção nas perturbações do desenvolvimento infantojuvenil.
Webinário “Redes sociais: a sua influência na autoestima e autoimagem corporal”
Durante esta sessão online, serão abordados temas como:
• Autoestima e Autoimagem Corporal;
• Comparação social online, algoritmos e reforço de conteúdo visual;
• Impactos Psicológicos negativos: ansiedade, depressão, perturbações do comportamento alimentar;
• Impactos Positivos: comunidades de apoio e body positivity;
• Higiene Digital: gestão de tempo e detox de conteúdo.