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Acolhimento Residencial de Crianças e Jovens: Estamos a falhar na proteção?
Descubra as lacunas existentes, riscos e soluções para reforçar proteção, qualidade dos cuidados e futuro seguro no Acolhimento Residencial de Crianças e Jovens em perigo.
Acolher é construir um lugar onde uma criança “ferida” volta a sentir-se segura. A questão impõe-se: no Acolhimento Residencial de crianças e jovens em perigo, estamos a falhar na proteção? A resposta exige olhar clínico, lucidez ética e frontalidade.
O que é Acolhimento Residencial Terapêutico?
O Acolhimento Residencial Terapêutico é uma resposta especializada para situações em que a família não garante segurança, cuidado e afeto de um menor. Falamos de crianças e jovens em risco por negligência crónica, violência doméstica, abuso físico e/ou sexual, exposição a consumos, abandono escolar, perturbações emocionais graves ou rutura dos vínculos.
No fundo, o Acolhimento Residencial combina residência, tratamento e projeto de vida e é sustentado por três eixos:
Ambas as formas de acolhimento têm a mesma missão: proteger crianças e jovens que são afastados do seu seio familiar pelas mais variadas questões que as colocaram em risco. A principal diferença está no tipo de ambiente que é oferecido aos menores.
Enquanto que o Acolhimento Residencial ocorre em casas de acolhimento para crianças e jovens, com recursos humanos e materiais específicos, no Acolhimento Familiar as crianças ou jovens são recebidas por famílias de acolhimento que acabam por oferecer um ambiente mais íntimo, próximo e individualizado.
O Serviço de Acolhimento Institucional é acionado quando medidas em meio natural falham ou são inviáveis, sendo que, ao contrário do que se pensa, o critério não é a pobreza, mas sim a insegurança a que o menor está sujeito.
Nas primeiras semanas, a avaliação deve mapear a história de trauma, os recursos internos, a rede familiar e o funcionamento escolar. Ferramentas padronizadas, entrevistas motivacionais e análise de risco alimentam um formulário único, que evita duplicações e permite poupar tempo clínico para intervir.
No caso de serem situações que envolvem menores de 12 anos, se existe consentimento dos progenitores ou representante legal e não oposição do próprio jovem, a CPCJ pode avançar. Sem consentimento, com oposição do jovem ou em casos de especial gravidade ou urgência, o caso segue pela via judicial. Já em situações de perigo atual ou iminente, aplicam-se procedimentos urgentes e medidas cautelares para proteger de imediato o menor.
O acolhimento residencial, como vimos, é uma das medidas de promoção e proteção de crianças e jovens em risco e a decisão fica formalizada através de um Acordo de Promoção e Proteção, pela CPCJ, ou em decisão judicial, onde são identificados prazos de revisão, duração, elementos específicos da colocação, etc.
São as equipas técnicas, normalmente dos Centros Distritais do ISS, IP, que identificam a casa de acolhimento mais adequada para o menor. É sempre dada prioridade à proximidade ao contexto de origem e preservação de fratrias, salvo se o superior interesse recomendar o contrário.
A integração das crianças e jovens em risco obedece a fases como preparação, acolhimento, avaliação diagnóstica, elaboração e execução do Plano de Intervenção Individual (PII), revisão e cessação. Durante todo este processo, a criança é informada e ouvida e a família de origem é envolvida, salvo decisão judicial em contrário.
Em até 60 dias após a aplicação da medida, elabora-se o Projeto de Promoção e Proteção (PPP), que fundamenta o PII com objetivos, ações, entidades, calendarização e avaliação, sempre com participação da criança ou jovem e (regra geral) da família. No fundo, o PPP define as finalidades e medidas de proteção, já o PII traduz estas finalidades em metas mensais, técnicas, responsáveis e indicadores.
A equipa técnica da casa de acolhimento atribuída ao menor é responsável por articular saúde, escola e comunidade, tendo em conta que os serviços públicos devem assegurar acesso prioritário a cuidados de saúde e inclusão escolar. Entre os direitos em acolhimento incluem: contactos regulares com a família, participação nas decisões, proximidade geográfica e não separação de irmãos (salvo se o superior interesse desaconselhar).
A duração da medida de acolhimento é a fixada no acordo ou decisão. No entanto, a revisão é obrigatória no termo desse prazo e, em qualquer caso, pelo menos a cada 6 meses, ou antes, no caso de ocorrer alguma mudança relevante.
A intervenção deve procurar o regresso em segurança à família de origem. Mesmo quando a família foi parte do problema, nesta fase deve ser parte da solução. Visitas estruturadas, treino parental, mediação de conflitos e planos de contacto graduais. Coparentalidade possível significa limites claros e colaboração pragmática. Quando isso não é possível, aposta-se na autonomização ou em soluções definitivas, como processos de adoção, sempre guiadas pelo superior interesse da criança.
Segundo o relatório CASA 2023, nesse mesmo ano, registaram-se cerca de 6.500 crianças e jovens sujeitas a medidas de acolhimento em Portugal.
Os números tornam-se ainda menos sorridentes quando se percebe que deste bolo, 5.409 menores encontravam-se em casas de acolhimento (centros de acolhimento temporário, lares de infância e juventude e acolhimento de emergência) e 263 estavam em situação de acolhimento familiar.
Em 2023, este mesmo relatório já alertava para uma problemática emergente: o aumento exponencial de crianças e jovens em Unidade Hospitalar e Cuidados Continuados Integrados de Saúde Mental – um reforço para a necessidade urgente do aumento de respostas nesta área.
As principais falhas apontadas aos processos e medidas de acolhimento de crianças e jovens, destacam-se:
Como vimos, o processo de acolhimento residencial ou familiar de crianças e jovens é longo, complexo e implica uma série de passos que requerem a intervenção especializada de diferentes profissionais.
Psicologia, serviço social, educação social, enfermagem, pedopsiquiatria, terapia ocupacional e animação sociocultural, CPCJ, tribunais, escolas e saúde – todas estas áreas e profissionais compõem a equipa multidisciplinar que acompanha crianças e jovens em perigo.
Para o sucesso das intervenções, e para mitigar as falhas enraizadas, é então necessário um investimento em formação contínua e especializada. E nesse sentido, o Instituto CRIAP disponibiliza uma oferta formativa alargada na área da proteção de crianças e jovens em risco.
Se deseja especializar-se na área do acolhimento de menores, destacamos as seguintes formações:
Na Especialização em Acolhimento Residencial Terapêutico de Crianças e Jovens em Risco vai aprender a gerir processos de acolhimento residencial e a adaptar a intervenção às necessidades individuais das crianças e jovens em risco, com o objetivo de promover a sua proteção e desenvolvimento saudável.
Destinada a profissionais que trabalham ou pretendem trabalhar com crianças e jovens em risco, como psicólogos, assistentes sociais, educadores, técnicos de instituições de acolhimento, esta formação aborda temas de extrema importâncias, tais como questões legais na intervenção com menores em risco, saúde mental e população em acolhimento residencial, intervenção psicológica com crianças, jovens e famílias, acolhimento familiar, entre outros.
No que diz respeito ao acolhimento de crianças e jovens em risco, falhamos quando prolongamos o que devia ser breve, quando substituímos relações por formulários, ou quando confundimos segurança com controlo. Mas também acertamos: todos os dias, em casas onde a rotina é terapêutica, o estudo volta a ser uma motivação e a esperança reaparece.
A resposta é não fechar portas e assumir um compromisso com o futuro, até que, criança a criança, caso a caso, proteger signifique verdadeiramente pertencer.