O Dia da Criança, celebrado a 1 de junho, é mais do que uma homenagem simbólica à infância. Deve ser um momento de consciencialização coletiva sobre os desafios reais que afetam milhões de crianças no mundo, entre os quais se destaca a saúde mental.
Segundo a
Fundação Calouste Gulbenkian, estima-se que entre 8% a 14% das crianças e adolescentes vivam com um transtorno mental, sendo que metade das perturbações mentais nos adultos tem início antes dos 14 anos.
A infância é uma etapa particularmente crítica, em que se moldam a personalidade, as competências emocionais e relacionais, a capacidade de aprender e até os alicerces biológicos para uma vida saudável.
Os problemas de saúde mental afetam desproporcionalmente as crianças em contextos de pobreza, vítimas de negligência ou maus-tratos, filhos de mães em risco de depressão, entre outros.
Num mundo que pretende garantir os direitos das crianças, ignorar esta realidade é uma forma de abandono estrutural.
A saúde mental infantil como direito fundamental
A
saúde mental infantil é, inequivocamente, um direito consagrado. A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pelas
Nações Unidas e ratificada por Portugal, reconhece o direito de cada criança ao mais elevado nível de saúde possível, englobando tanto o bem-estar físico como o mental.
Este compromisso legal vincula os Estados à criação de condições que garantam o acesso a cuidados de saúde adequados, eficazes e sustentados. Em particular, o
artigo 24.º da Convenção estabelece que os governos têm o dever de assegurar serviços que promovam a saúde integral da criança.
Negligenciar o sofrimento psicológico, desvalorizar sinais de perturbação emocional ou não disponibilizar os apoios necessários constitui, assim, uma violação grave dos direitos fundamentais da infância.
O reconhecimento legal impõe, portanto, uma responsabilidade ética e política clara: proteger a saúde mental das crianças é garantir-lhes o direito a crescerem com dignidade, segurança e possibilidades reais de desenvolvimento pleno.
Infância: Uma fase crítica de desenvolvimento emocional
A infância é uma fase profundamente sensível e determinante para o desenvolvimento emocional. É durante os primeiros anos de vida que o cérebro se encontra mais plástico e recetivo, moldando-se intensamente em resposta às experiências vividas.
As vivências positivas, marcadas por afeto, estabilidade e proteção, constroem as bases da autorregulação emocional, da empatia e da confiança interpessoal.
Pelo contrário, situações adversas como negligência,
violência ou a ausência de vínculos seguros podem alterar de forma significativa a arquitetura cerebral e comprometer o
equilíbrio emocional e cognitivo da criança ao longo da vida.
Não basta garantir cuidados físicos, sendo fundamental assegurar ambientes que favoreçam a previsibilidade, a escuta e a segurança emocional. É nesse contexto que se desenvolvem a resiliência psicológica, o sentido de identidade e a capacidade para enfrentar desafios ao longo da vida.
Proteger a infância é, por isso, uma responsabilidade inadiável com impacto direto no bem-estar das gerações futuras.
Fatores de risco e de proteção de menores
A saúde mental infantil é fortemente influenciada pelo equilíbrio entre fatores de risco e de proteção. Ambientes adversos, como a exposição contínua a gritos, instabilidade, pobreza extrema ou
abuso, afetam diretamente o desenvolvimento do cérebro, em especial o córtex pré-frontal, comprometendo a regulação emocional e a capacidade de decisão.
Entre os principais fatores de risco, destacam-se:
• Violência ou negligência emocional;
• Condições socioeconómicas precárias;
• Exclusão social ou discriminação.
Por outro lado, os fatores de proteção funcionam como verdadeiros amortecedores:
• Vínculos afetivos seguros com adultos de referência;
• Ambientes familiares e escolares estáveis e acolhedores;
• Espaços que valorizem a expressão emocional e o bem-estar.
Criar contextos protetores é essencial para promover o desenvolvimento saudável e prevenir perturbações futuras.
Sinais de alerta na saúde mental infantil
Os sinais de alerta na saúde mental infantil são, muitas vezes, subtis e facilmente desvalorizados pelos adultos. As crianças não expressam o sofrimento psicológico da mesma forma que os adultos, o que exige atenção redobrada por parte de quem as rodeia.
Mudanças abruptas no comportamento, como isolamento social, irritabilidade persistente, regressões no desenvolvimento (como voltar a urinar na cama), dificuldades de sono, alterações no apetite ou queixas físicas recorrentes sem causa médica identificável, podem ser manifestações de sofrimento emocional profundo. Também comportamentos agressivos sem motivo aparente ou uma perda súbita de interesse por atividades antes prazerosas merecem especial vigilância.
É essencial que pais, educadores e profissionais estejam atentos e desenvolvam uma escuta ativa, empática e livre de julgamentos. Muitas vezes, o silêncio de uma criança não é sinal de tranquilidade, mas um apelo invisível à compreensão.
Observar, validar emoções e criar espaços seguros de expressão são passos fundamentais para identificar precocemente perturbações e encaminhar para apoio especializado. Ignorar estes sinais é adiar intervenções que podem ser decisivas para o bem-estar presente e futuro da criança.
O Papel da Escola na Promoção da Saúde Mental
A escola desempenha um papel central na promoção da saúde mental das crianças e jovens. Para além da sua função académica, deve ser um espaço previsível, seguro e emocionalmente nutritivo, onde cada criança se sinta valorizada.
Os climas escolares positivos, baseados na estabilidade, no respeito e na
inclusão, constituem fatores protetores que potenciam o desenvolvimento da autoestima, da empatia e das competências de autorregulação emocional.
A Saúde Mental e a Tecnologia
O uso excessivo de ecrãs na infância está associado a
alterações do sono,
défice de atenção, maior irritabilidade e dificuldades de controlo emocional. A exposição contínua a estímulos digitais pode comprometer o desenvolvimento neurológico e afetar negativamente as interações sociais e o rendimento escolar.
Tal como se ensinam hábitos de higiene pessoal, também é essencial promover uma higiene digital saudável. Isso implica estabelecer pausas no uso da tecnologia, limitar o tempo de ecrã, incentivar atividades offline e educar para a utilização consciente dos dispositivos digitais. A literacia digital deve ser entendida como uma competência emocional e social fundamental nos dias de hoje.
A importância da Intervenção Precoce
A deteção precoce de
patologias e perturbações mentais é um fator-chave para o sucesso da intervenção. Quanto mais cedo forem identificados os sinais de sofrimento emocional, maiores são as probabilidades de um percurso de recuperação eficaz.
A abordagem deve ser integrada e multidisciplinar, envolvendo psicólogos, pediatras, terapeutas ocupacionais, professores e assistentes sociais, para uma resposta coordenada às necessidades da criança.
Formação contínua como pilar da intervenção qualificada
A promoção da saúde mental infantil depende, em grande medida, da preparação de quem acompanha diariamente o crescimento das crianças. Professores, técnicos de saúde, psicólogos e profissionais da área social têm um papel crucial na deteção precoce de sinais de sofrimento emocional e na implementação de estratégias eficazes de apoio.
Para isso, é essencial manter uma atualização constante de conhecimentos e práticas, alinhada com a evidência científica e com as exigências atuais da infância. Profissionais bem preparados conseguem oferecer respostas mais seguras, empáticas e transformadoras, promovendo o bem-estar e o desenvolvimento saudável das novas gerações.
O Dia da Criança é uma ótima oportunidade para investir na sua formação. Por isso, damos-lhe a conhecer as nossas formações especializadas que vão ajudar a reforçar a sua capacidade de intervenção na área da saúde mental infantil.
Especialização Avançada em Enfermagem de Saúde Mental na Infância e Adolescência
Especialização Avançada em Proteção de Crianças e Jovens
Esta especialização capacita os profissionais para intervir em contextos de risco e perigo, através de uma abordagem multidisciplinar. Foca-se na identificação de situações de vulnerabilidade, no uso de instrumentos de avaliação e na aplicação prática da legislação, promovendo uma atuação eficaz e ética na defesa dos direitos das crianças e jovens.
Curso em Enfermagem de Saúde Mental na Infância e Adolescência
Neste curso os formandos irão identificar alterações da saúde mental em crianças e adolescentes, aplicar cuidados de enfermagem adequados e intervir em contextos clínicos e preventivos. É uma formação dirigida a profissionais e estudantes da área da enfermagem, representando uma mais-valia curricular no âmbito da saúde mental infantojuvenil.
Curso em Prevenção e Proteção Contra os Maus Tratos em Crianças e Jovens
Um curso que tem como foco o reconhecimento de sinais de abuso, a aplicação de técnicas de avaliação e diagnóstico e a adoção de procedimentos adequados em contextos de risco. Promove um olhar crítico e fundamentado sobre as diferentes formas de maus tratos, contribuindo para uma atuação preventiva, ética e eficaz na proteção de crianças e jovens.
Celebre o Dia da Criança da melhor forma: invista na sua formação e ofereça uma intervenção mais eficaz às crianças e jovens com as quais trabalha.